20/02/2011

Um Homem Que Grita - O Silêncio da Inutilidade



Um homem costuma se definir por aquilo que faz - engenheiro, radialista, ator etc - ao invés de reconhecer as qualidades que possui, independente da sua ocupação. No longa Um Homem Que Grita (Un Homme Qui Crie, 2010), não se ouve em nenhum momento a voz do seu protagonista em um tom mais alto do que o natural, mas sentimos seu grito sufocado pela posição que um pai deveria ocupar em uma situação como a sua. O homem liga-se muito mais facilmente ao "fazer" do que a mulher, o que causa um enorme sentimento de vazio e inutilidade quando ele se encontra sem trabalho - algo que foi bem explorado no longa As Confissões de Schmidt (About Schmidt, 200_), de Alezander Payne, que tratava sobre as consequências da aposentadoria na mente masculina.

Adam (Youssouf Djaoro) tem 60 anos de idade, é ex-campeão de natação, e há 30 anos trabalha como guardião de piscina de um hotel de luxo situado no Chade, na África. Contudo, começa a ocorrer a privatização do estabelecimento e ele se vê obrigado a ceder sua vaga para seu filho Abdel (Diouc Koma), situação que o incomoda bastante por ver nela um declínio social. Durante muito tempo, Adam se estabeleceu como o empregado da piscina - como ele mesmo afirma em certo momento, "a piscina é a sua vida" -, onde podia observar as pessoas vivas diante dele, fossem jovens ou adultas, mas que lhe dava prazer de estar ali. Quando passa a ser porteiro do mesmo hotel, sente ao mesmo tempo o vazio de ser "mais um" personagem invisível daquele estabelecimento, cuja única serventia é abrir a passagem para carros conduzidos por motoristas com janelas fechadas.

Mas o que choca o espectador, na realidade, é decisão que o protagonista toma a fim de resgatar sua posição como guardião da piscina: como seu país passa por uma guerra civil, Adam precisa ajudar o governo com dinheiro ou enviando seu filho para que lute pelo país. Assim, ele toma a decisão de enviar seu filho para a guerra como uma maneira de também recuperar seu cargo na empresa, mas viverá a culpa de destruir sua própria família até que aconteça sua redenção ao final do longa. Mahamat-Saleh Haroun constrói um longa que explora a intimidade de seus personagens com naturalidade, investindo em extremos close-ups que tentam nos colocar quase dentro de suas mentes, deixando-nos à vontade para tomar partido pelas decisões que eles tomam. Seu elenco trabalha de forma sutil e delicada, com um trabalho que beira ao documental, mas com uma certa dose de poesia que surge insuspeita mesmo diante de atos tão questionáveis.

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