23/02/2010

Guerra ao Terror: Guerra ao Próximo?



Incrível como uma diretora consegue obter um olhar tão perspicaz sobre o universo masculino da competição, da resolução das diferenças e do ocultamento de sentimentos como afeição e perdão. Guerra ao Terror retrata com tintas escaldantes a rotina exaustiva física e psicologicamente dos soldados responsáveis pelo desarmamento de bombas abandonadas em pontos das cidades em guerra.


Tendo como protagonistas William James, responsável pelo desarmamento, e os soldados Sanborn e Eldridge, o roteiro desconstrói o universo da guerra para oferecer ao espectador um cenário para tratar sobre tolerância, diferenças, afeição, perdão como elementos essenciais de uma dinâmica do conflito: conflitos entre James e Sanborn, de Eldridge com ele mesmo, de todos contra todos. Todos somos bombas espalhadas pelo mundo, onde, mexendo nos fios errados, podemos causar estragos a nós mesmos e aos próximos. Como estes soldados conseguem resolver, mesmo violentamente, seus conflitos e nações inteiras não o fazem? Por que temos tanto temor em oferecer a outra face?


Bigelow compõe este mundo rústico e patriarcal e traz ao espectador um roteiro que supera os mais diversos clichês dos filmes de guerra: as esposas ansiosas recebem ligações angustiadas dos soldados, os ideais de honra e coragem dão lugar ao conflito e intolerância dentro do próprio pelotão. A cineasta compreende a covardia como parte daquele universo: matar James seria uma solução fácil para Sanborn ao invés de resolver seu conflito de maneira direta, assim como seria simples para o psicólogo falar a Eldridge sobre viver em guerra sem tê-lo feito um dia da sua vida. Vive-se uma guerra distante espaço e temporalmente, mas esquece-se de um conflito bem mais nocivo: com o próximo.

O Lobisomem: Sessão fraca, mas já esperada


Ao entrar na sessão para assistir o longa de Joe Johnston, já imaginava o que veria pela frente: membros estirpados, roteiro prevísivel e esburacado e e sutileza zero na mão de um diretor conhecido por seus filmes superlativos - vide Rocketeer, Jumanji e Jurassic Park III. Tendo em mãos essa "necessidade" de realizar uma nova versão de um personagem clássico do cinema, o diretor se equilibra entre fazer cinema à moda antiga e trazer às novas gerações o surgimento de uma nova franquia.

O diretor, no entanto, realiza um longa que se restringe ao rótulo de "versão 2.0" do lobisomem, ignorando possibilidades de realizar uma verdadeira transformação temática ou estética do que costumamos associar às personagens. Benico Del Toro, Anthony Hopkins, Emily Blunt e Hugo Weaving esforçam-se para tornar mais atrativa a sessão, mas não conseguem realizar o milagre de transformar água em vinho, por conta de um roteiro que prefere reunir todos os clichês possíveis e imagináveis sem superá-los, fornecendo "reviravoltas" mais do que previsíveis e um final "aberto" que propõe a realização da sequência.

O Lobisomem pode render muito, mas está distante de tornar memorável o personagem que tantos outros longas inspirou anteriormente.

01/02/2010

Avatar. Tecnologia de ponta. Roteiro em P&B.


Os EUA ainda tentam curar os males do preconceito tão presentes no seu mais íntimo. Talvez seja esta uma das razões que levem à contrução de tantas obras que enfatizem a absorção da cultura estrangeira pelos norte-americanos - vide Dança com Lobos, O Último Samurai e tantos outros. James Cameron constrói, desta vez, um universo fantástico onde Jake, um soldado paraplégico, se infiltra no planeta Pandora a fim de trazer informações valiosas para exploração de recursos por uma empresa multinacional em constante expansão. Utilizando-se do avatar criado para seu irmão morto, Jake envolve-se emocionalmente com os Na'Vi, habitantes do planeta, e, mesmo sofrendo com o ofício que precisa cumprir, entrega as informações para a equipe militar, que destrói o lugar e a civilização em busca dos recursos que precisam para expandir ainda mais seu domínio comercial. Mas o envolvimento de Jake pelos Na'Vi leva-o a engendrar uma batalha contra seus próprios empregadores, na tentativa de salvar aquela civilização.

James Cameron, depois de anos de hiato, traz uma obra que, tecnologicamente, cumpre seu papel como uma revolução sem parâmetros na experiência do "ver cinema", do "experimentar o cinema", porém, em contrapartida, cria uma narrativa repleta de clichês cinematográficos que não envolvem suficientemente o espectador com um senso crítico mais apurado. Tendo para si três horas longa-metragem, o diretor não aproveita o tempo que possui para delinear melhor suas personagens, mas traz para cada um as perguntas e respostas "espertas" comuns nos seus longas, mas que pouco fazem para torná-los pessoas de verdade. A experiência cinematográfica não se restringe à uma estética visual ou sonora impecáveis, mas tudo isso está a serviço de uma história que encaminhe o espectador para o universo proposto pelo diretor. Talvez preocupado em excesso com o avançar da sua tecnologia, Cameron propõe uma narrativa ultrapassada e preguiçosa, cujas possibilidades ficam na metade quando vemos um desenvolver tão pobre de personagens - como as propostas para Giovanni Ribisi, Sigourney Weaver, Stephen Lang e Michelle Rodriguez, repletos de estereótipos - que, paradoxalmente, reforça algo que o diretor almeja dissipar: o preconceito. Mas, dessa vez, voltado para os universos da ciência, do militarismo e das grandes empresas.

Não nego, nesse momento, que tais campos não possuam as características que são apresentadas no filme, mas proponho o seguinte: será que, da mesma forma que Cameron nos propõe que enxerguemos os Na'Vi com olhos livres de julgamentos e opiniões formadas, não poderíamos fazer o mesmo com os redutos que o circundam? Será que não está tudo tão preto e branco que esquecemos dos tons de cinza?