10/02/2011

O Vencedor e os filmes de superação



Da longa tradição dos filmes de esporte, podemos encontrar diversos exemplares, onde a superação dos limites físicos torna-se tema central a ser desenvolvido através da narrativa. No entanto, quando se observa a história de O Vencedor (The Fighter, 2010), percebe-se que, por mais que todos seus elementos típicos estejam dispostos, esta obra consegue dialogar com frescor e maturidade além da simples história motivacional que acomete tantos outros filmes do gênero.

Empregando uma linguagem propositadamente metalingüística, David O. Russell começa mostrando os bastidores das gravações de um documentário sobre Dicky Ecklund (Christian Bale), pugilista que teve seu auge ao enfrentar o campeão mundial Sugar Ray Leonard, vivendo até hoje desta fama, apesar de ter desperdiçado a carreira devido às drogas. Com o passar do tempo, passa a focar na trajetória de Micky Ward (Mark Wahlberg), seu irmão, que tenta agora a sorte no mundo do boxe, sendo treinado por Dicky e empresariado por Alice (Melissa Leo), sua mãe. No entanto, sua família sempre o coloca em segundo plano em relação a Dicky, o que impede que Micky consiga ascender no esporte. Essa situação muda quando ele conhece Charlene Fleming (Amy Adams), que o incentiva a deixar a influência familiar e tratar a carreira de forma mais profissional.

Com um título brasileiro pouco sutil e uma estrutura convencional, Russell destila sua linguagem dinâmica e despretensiosa não para ironizar as figuras com que lida na sua história, como ocorria em Três Reis (Three Kings, 1999), mas para torná-las mais próximas de si mesmo e, por conseqüência, do público. Seu quarteto de atores torna-se o maior destaque do longa: enquanto Mark Wahlberg conduz seu Micky com paradoxal fragilidade e devoção diante daqueles que ama e Amy Adams equilibra-o com a força e o destempero de Charlene, tudo que seu amado necessita para fugir dos laços de fracasso que sua família construiu em torno dele. Contudo, reside na contundência de seus coadjuvantes sua maior força: Christian Bale constrói uma personalidade magnética e destrutiva para o fracassado e viciado Dicky, enquanto Melissa Leo doma a platéia com o retrato apaixonado e agressivo de Alice, uma mãe que não concebe as consequências da péssima administração que faz da carreira do filho.

Depois de ver a ascensão do protagonista no longa, o espectador percebe que os maiores desafios enfrentados por Ward não foram somente no ringue de boxe, mas dentro das paredes familiares, onde, considerando-se protegido, não percebia quão nocivas podem ser determinadas convivências, por menos intencionais que sejam. Ele aprendeu a gritar com sua voz, mas principalmente, os momentos de silenciá-la para liberar o perdão para criaturas tão humanas quanto ele mesmo. Mergulhando abruptamente no universo real e denso de suas personagens, Russell cria uma obra que reflete sobre a construção de uma identidade e os sacrifícios que realizamos na tentativa de alcançar o que desejamos. Wahlberg, Bale, Leo e Adams participam com tamanha veracidade sesta experiência que, por vezes, esquecemos que estamos diante de uma tela e nos permitimos acompanhar as escolhas certas e erradas destas pessoas como se fossem uma parte de nós.

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