15/11/2010

Janela Crítica - INT 05 – Estados Alterados


Quando se fala em alteração de estados, pode se pensar em estados físicos – sólido, líquido e gasoso -, o que também pode ser pensado em estados emocionais, quando pensamos estar mais firmes ou alucinados de acordo com o momento.

Uma sensação de estranhamento permeia o primeiro curta do programa - A history of mutual respect (Gabriel Arantes e Daniel Schmidt, 2010) conduz o espectador por uma história onde o desrespeito não se esconde através de atitudes polidas e falsas, mas emerge das relações de suserania e vassalagem que os personagens exercem. A ironia e o paradoxo constituem um ponto-chave do roteiro através de diálogos ao mesmo tempo filosóficos e preconceituosos, fortalecidos por meio de imagens inquietantes e belas – como a perseguição do homem branco nu à nativa desprotegida pela floresta na tentativa de miscigenar e perpetuar sua raça naquele lugar.

Propondo um olhar mais absurdo e cômico sobre as sensações, Floating Head (Ben Dickinson, 2010) flerta com os filmes fantásticos trash utilizando efeitos especiais toscos para trazer à tona diferentes relações que possuímos com o desconhecido: medo, rejeição, falta, anseio, amor, aceitação. Tudo isso demonstrado da maneira mais esdrúxula e divertida possível, ainda que de maneira rasa.

Indo na direção oposta ao trabalho anterior, ao criar uma mitologia muito simbólica e hermética para lidar com sentimentos como perda e morte, o curta If there be thorns (Michael Robinson, 2009) não consegue uma comunicação ampla com o espectador por centrar-se em um universo extremamente denso e intrincado. Uma obra para se ver uma vez para ser sentida, mas para se rever para ser compreendida.

Voltando ao ar debochado, a paródia dos filmes trash, o curta Health – We Are Water (Eric Wareheim, 2010) mescla linguagem de HQs e clichês do filme de horror – em slow motion, uma garota corre por uma floresta, sendo perseguida por um assassino –, mas propondo uma distorção que o eleva ao escracho total dos slash movies. Uma montanha russa de emoções - do medo ao riso – cujo único propósito é divertir.

Por sua vez, a narrativa linear de Jesusito de mi vida (Jesus Perez-Miranda, 2009) expõe a relação de uma criança com a religião: pouco antes de dormir, um menino sente vontade de ir ao banheiro, mas, por ter medo do escuro, reza a Jesus para que Ele tire sua vontade de urinar. Enredo, direção e interpretação coesos e sutis em uma obra mais esquecível do que tocante.

Caminhando na contramão dos trabalhos anteriores, com a técnica de animação impressionante, Dot (Sumo Science, 2010) lança seu espectador em êxtase para um mundo de aventuras que acontece num cesto de novelos, agulhas e retalhos, gerando um retrato alucinante e imaginativo das possibilidades infinitas da arte cinematográfica.

Propondo um olhar mais reflexivo e empregando belamente uma fotografia em preto e branco e elementos de teatro de formas animadas, El Paraiso de Lili (Melina Leon, 2009) tem como protagonista uma garota que começa a se revoltar com “sistema” que governa o Peru de 1988. Singelo e sincero, ainda que pareça um curta perdido, quando se pensa na temática do programa.

Finalizando a mostra internacional, o curta Fear Thy Not (Sophie Sherman, 2010) mostra o percurso de uma mão que guia seu corpo rumo ao desconhecido, cantando uma música como se fosse uma âncora de segurança em meio à escuridão. Um cinema que trata de sensações quase táteis, ainda que pouco desenvolvido.

A alteração dos estados emocionais proposta pelo programa parece ir além das temáticas das histórias que estão sendo contadas, mas permear a experiência cinematográfica do público daquela noite, que se percebia com uma variedade de sensações – riso, tristeza, medo, reflexão, êxtase etc – em poucos minutos.

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