19/11/2010

Janela Crítica - BRA 07 – De frente para a cidade


Ao olhar para os lugares onde habitamos de dentro para fora ou de fora para dentro, percebemos os meandros que saltam aos olhos e seguem além do simples concreto, mas tornam-se sensações que carregamos dentro de nós. Dessas sensações, o programa De frente para a cidade explora seus trabalhos.

Da sequidão nordestina, surge o primeiro curta – O Som do Tempo (Petrus Cariry, 2010) –, em que o espectador, de início amedrontado com os gigantes letreiros iniciais, mergulha sem medo na realidade miúda que o diretor exibe através de uma inspirada paleta de cores e monocromias e uma sonoridade quase sólida de tão presente, composta pelos sons diegéticos. Sem se prender ao ambiente sertanejo onde se fundamenta, o curta se universaliza ao deslocar sua câmera pelo mínimo, pelo zoom extremo ao cotidiano, onde sons e ritmos triviais compõem uma sinfonia sobre a própria passagem do tempo: ele não nos pertence, mas somos nós que caminhamos por sua estrada.

Transitando através das complicações do ajuntamento social, político, histórico das pessoas que nele habitam, Dias de Greve (Adirley Queirós, 2009) mostra-se um curta bem produzido, mas pouco inspirado – no quesito roteiro, direção e interpretação – para tratar dos embates entre as lutas trabalhistas a necessidade de sobrevivência. O espectador acompanha sem muita expectativa as discussões dos proletários grevistas, dos fura-greves e a relação posterior ao retorno para o trabalho, em que opressor e oprimido mantém-se da mesma forma – sintetizado pela cena final, onde, embora no mesmo lugar, os homens ainda assim deixam-se levar pelas relações hierárquicas.

Caminhando na contramão dos curtas anteriores através da criação de um mito dentro do universo urbano da Bahia, O sarcófago (Daniel Lisboa, 2010) mostra a composição primitiva e apocalíptica de um artista plástico para sua maior obra de arte: ele mesmo. Lisboa, através de uma edição precisa, uma trilha sonora contundente e impulsionante e enquadramentos estudados, consegue compor a dinâmica de sua personagem e permitir que o filme seja completamente dela. Religião e futurismo se mesclam em um Frankenstein estranho aos olhos da cidade, mas que comunica essa necessidade de transcender as barreiras temporais e espaciais da representação de si mesmo para seus companheiros de comunidade.

Finalizando esse ciclo – que parte de um olhar dos pertencentes à comunidade e chegando a um olhar marginal -, o curta Bailão (Marcelo Caetano, 2009) trata de um salão em São Paulo que reúne homossexuais de todas as faixas etárias pelo único propósito de comungar um momento: a dança. A partir de depoimentos de participantes de um “submundo” homossexual, o diretor costura uma relação de opressão em relação à cidade, à comunidade que segrega aqueles que optam por assumir uma sexualidade diferente dos padrões. Mesmo sem inovar esteticamente, o curta propõe um painel honesto de um arrependimento pelo que não se viveu, onde público e o particular se misturam com uma historicidade doída pelo amor não-concretizado.

Através de olhares tão pessoais sobre o lugar onde se vive, seus diretores mostram que as relações que se estabelecem na comunidade podem ser de afeto ou rejeição, de aceitação e medo, por que nossos habitats influenciam e são influenciados por aqueles que deles participam, sejam cineastas ou espectadores.

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