10/12/2010

Milk por uma sexualidade de fato humana


No longa evolução racional, artística, política, tecnológica etc que a Humanidade realizou e testemunhou durante todos esses anos, a sexualidade pode ser considerada uma das áreas que encontrou as maiores dificuldades. Talvez pelo seu caráter universal, talvez pelas reservas com que a sociedade ocidental acostumou-se a tratar desta temática, mas em nenhum momento pode-se negar que se trata de um tema complexo, onde não se pode – ou não se deve – simplesmente ser maniqueísta ou tentar encerrar o discurso em uma linha ou vertente que atenda a todos os discursos satisfatoriamente.

Nos Estados Unidos, a educação conservadora que regia a Constituição do país precisou ser revisitada depois que uma pessoa comum fez valer os seus direitos: Harvey Milk foi um ativista dos direitos homossexuais que, ao se mudar com seu namorado para São Francisco no início dos anos 70, abriu uma loja de revelações fotográficas e, depois de passar pelo preconceito da comunidade local, surpreendeu a todos ao se tornar um verdadeiro agente de mudanças. Com a ajuda de amigos e voluntários, foi eleito para o Quadro de Supervisores de São Francisco em 1977, tornando-se o primeiro homossexual a ser votado para um importante cargo público nos Estados Unidos. No filme de Gus Van Sant – Milk -, mostra-se o lançamento de sua candidatura, assim como a sua vitória, após sucessivas derrotas, seguido dos infortúnios que se seguem após o cumprimento de suas propostas. O roteiro habilidoso de Dustin Lance Black equilibra o ponto de vista de Milk com as situações que o mesmo vivenciou ao longo dos oito anos em que trabalhou em seu ativismo, tratando-o de forma humana e sincera.

Gus Van Sant alia à uma edição caprichada e dinâmica - que une reconstituições com atores e fotos e videos reais da época - um excelente trabalho com seus atores – principalmente nas performances cativantes de Sean Penn, James Franco e Josh Brolin - para compor um cenário majoritariamente político, mas que ainda acreditava em mudanças positivas através do engajamento de pessoas comuns ao poder. Talvez seu maior mérito seja mostrar outro lado desta comunidade: não mais sofredora ou culpada pelos sentimentos que possuem pelo mesmo sexo, mas arrojada nas mudanças de qualidade de vida que almeja na sociedade que tanto ama. Se, em tempos anteriores, filmes como Brokeback Mountain (Ang Lee, 2006) e Boys Don’t Cry (Kimberly Pierce, 1999) tocavam o espectador pela maneira como abordavam o sofrimento pela condição dos homossexuais – as angústias internas e as conseqüências do assumir sua sexualidade de maneira dolorida -, o longa de Van Sant mostra um grupo forte, que, mesmo temendo suas retaliações, se mantém seguindo, pois, como mostra o discurso inicial de Milk, eles se sentiram recrutados para defender seus próprios direitos.

Talvez o maior abismo que exista entre o Eu e o Outro esteja naquilo que nos universaliza: o amor e a sexualidade. Milk simplesmente desejou transpor esse abismo, estendendo a mão para que conhecêssemos a sua maneira de pensar e sentir e ir além do mero julgar.


Nenhum comentário:

Postar um comentário