19/03/2009

Das Cidades de Deus - Do filme para trás







Quando se pensa nas adaptações de livro para cinema, poucas vezes o público leitor fica satisfeito com o resultado final. Mas uma pergunta: como reagem aqueles que lêem o livro depois de ver o filme?

Bom, já estive dos dois lados da moeda e posso refletir um pouco sobre o processo de adaptação de filme para livro na minha cabeça. Começarei com o mais recente: Cidade de Deus, escrito por Paulo Lins, roteirizado por Bráulio Mantovani e levado às telas por Fernando Meirelles. Caso típico de "experiência multimídia", entrei em contato com livro, filme, roteiro, trilha sonora etc nestes anos em que o filme fez parte de minha consciência.

Mantovani e Meirelles são responsáveis por unir num longa de duas horas a história de diversos personagens, reduzindo a trama complexa do livro - que contém inúmeros personagens e situaçõs que dificilmente seriam aproveitadas no longa como um todo. Mas algo se mantém: o espírito fragmentado, cinematográfico que Lins traz às diversas tramas, além do rápido processo de anarquia que ronda a favela ao longo dos anos.

Temos a batalha entre Zé Pequeno - no livro, Zé Miúdo - e Mané Galinha - originalmente, Zé Bonito -, além de diversas outras passagens protagonizadas por Buscapé, Barbantinho, Madrugadão, Acerola, Filé com Fritas, Laranjinha, a turma do Caixa-Baixa, que ganham mais força e detalhamento nas linhas de Paulo Lins. Mantovani, no entanto, adiciona à verve popular do autor uma ironia tipicamente burguesa, que distancia e estetiza a paixão e a violência com que estes seres marginais conduzem sua vida.

A metalinguagem esperta da narração de Buscapé não está nas linhas passionais do livro, mas fazem parte de um longo processo de autoria de Mantovani, que recria boa parte da estrutura do livro, o que favorece - e muito - na produção do longa, que se diferencia do retrato que por tantas vezes o Brasil fez de si mesmo na tela. A veia popular dá lugar ao pop, que torna excitante e quase bela a violência do longa, tamanho o trabalhar do estilo de roteirização e direção.

Os diálogos rápidos e espontâneos ainda estão lá, com adição de elementos sexuais mais violentos que o filme opta por não aprofundar. Não gostaria de entregar juízos de valor comparativos a respeito dos três contatos - com filme, roteiro e livro -, pois creio que são experiências diferentes, que demandam espírito diferentes e mente aberta para a constante recriação de uma história, seja por um escritor, um roteirista ou um diretor. E, afinal, qual seria a graça?

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