O ser humano, em suas sensações de inferioridade,
cria ou adora mitos que o conduzam a algum estado de êxtase superior ao
cotidiano banal e prosaico com que precisa lidar. Se, na Antiguidade e Idade
Média, emergiam os diversos deuses da Mesopotâmia e Egito, passando pelo Deus
do cristianismo, pelo Alá do Islamismo, chegamos, a partir da Idade Moderna, ao
homem que enfatiza o olhar para si mesmo, para o “deus” dentro de si mesmo, em
sua racionalidade. A famigerada Pós-Modernidade, entretanto, começa a propagar
a descrença em possíveis valores absolutos, como Razão, Fé ou qualquer coisa do
gênero. Quem são, portanto, os novos mitos que adoramos? Os pop-rock-disco-reggae...stars,
as celebridades instantâneas, e, em tempos de Youtube, Facebook e similares, A
VIDA ALHEIA.
A
partir deste preâmbulo, não fica muito difícil perceber o subtexto presente em
Detroit Rock City (idem, Adam Rifkin, 1999), uma comédia absurda e
divertidíssima que versa sobre quatro jovens no final de sua adolescência que,
em sua veneração inabalável pelo grupo KISS, parte para Detroit para assistir
aquele que seria o show de suas vidas. Os quatro jovens, em suas personalidades
distintas, se complementam e se ajudam nas encrencas em que se metem ao longo da
jornada: enquanto Jam chega mais perto de ser nosso protagonista ao ter seu sofrimento
em não conseguir enfrentar sua mãe católica ortodoxa e fumante compulsiva mais
destrinchado, os outros se dividem entre o desprendido e revoltado Hawk, o
lerdo Trip e o nice-guy Lex. Cada um, a seu modo, procura encarar os
preconceitos com aqueles que não entendem seus sentimentos em relação ao grupo de
roqueiros conhecidos como demônios, bichas, baderneiros, dentre outras
nomenclaturas pouco elogiosas.
Dentre
as inúmeras personagens e situações arquitetadas pelo roteirista Carl V. Dupré – conhecido por
filmes B de terror, experiência utilizada em determinada sequências do longa -, Rifkin usa sua versatilidade como ator, escritor e produtor para dirigir um
longa com uma velocidade e uma qualidade pop bem MTV. Ou seja, a direção
atualiza as conquistas da geração do final dos 70 para um novo público ao
trazer numa linguagem juvenil e dinâmica ícones da época como Burt Reynolds, As
Panteras, MAD Magazine, Star Wars e outros que fizeram a cabeça de seus pais. A
linguagem de desenho animado nonsense
faz a festa com um maniqueísmo alucinado e, às vezes, expressionista
proporcionam o ponto de vista dos jovens sobre suas próprias descobertas e
sensações do que significava ‘ser jovem nos anos 70’.
Com
personagens cativantes e divertidos envoltos em uma trama cheia de peripécias e
absurdos, Detroit rock City é uma boa pedida para um sábado à noite regado a
muito rock setentista para reviver uma época. Se o homem um dia foi chamado de
servo, fiel, adorador de seus deuses, hoje, ele encara uma nova nomenclatura
diante de seus deuses: fã.
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